UEM 2008 – verão

UEM 2008 – verão
Questão 01
Considere o seguinte texto:
“A Companhia de Desenvolvimento Habitacional e
Urbano (CDHU) reviu o conceito de família e, agora,
passa a conceder financiamento para casais
homossexuais, solitários com mais de 25 anos, famílias
mononucleares (pais e mães solteiros) e anaparentais,
como avós e netos, tios e sobrinhos, irmãos ou primos,
além de uniões baseadas não no parentesco, mas na
ligação afetiva. Até então, a CDHU só aceitava como
beneficiários de seus programas homens e mulheres
casados ou registrados em uma união estável.” (Jornal O
Estado de São Paulo, Caderno Cidades, 09/08/2008).
Assinale o que for correto sobre esse trecho de
reportagem e o tema do qual ele trata.
 
01) As informações da reportagem autorizam afirmar que
a instituição familiar diminuiu sua importância nas
sociedades contemporâneas.
02) As mudanças descritas na reportagem mostram que,
diferentemente do que afirmam muitas teorias
sociológicas, a família deixou de ser a primeira
instituição à qual os indivíduos pertencem.
04) A reportagem sobre os novos critérios utilizados pela
CDHU para financiar moradias é reveladora do
quanto as regras que autorizam ou proíbem
determinados tipos de uniões familiares variam no
espaço e no tempo.
08) Os novos conceitos de família utilizados pela CDHU
permitem concluir que a função reprodutiva está
deixando de caracterizar, centralmente, a instituição
familiar.
16) Podemos concluir da reportagem que as
transformações pelas quais a sociedade vem passando
forçam o Estado, muitas vezes, a rever seus critérios
de distribuição de recursos públicos e de acesso a
serviços.
 
resposta: 28

Raquel Garrido diz que esquerda francesa se inspira na resistência latina

À Caros Amigos, candidata a deputada fala de projetos para o país e a Europa

Por Caio Zinet
Caros Amigos

François Hollande venceu as eleições presidenciais francesas, mas a grande surpresa foi o desempenho da Frente de Esquerda, que liderada pelo candidato socialista Jean-Luc Mélenchon, obteve 11,11% dos votos com propostas claras de enfrentamento ao sistema financeiro, e de fundação da 6ª república francesa com a convocação de uma assembleia nacional constituinte que inverta as prioridades do estado francês.

O próximo desafio da frente, que reúne vários partidos e movimentos descontentes com o Partido Socialista, são as eleições para a Assembleia Nacional Francesa. Nessa entrevista, Raquel Garrido, candidata a uma das 11 vagas para deputado eleitos por residentes do México à Patagônia, apresenta as propostas da frente da esquerda para a crise francesa e europeia, e diz que a frente se inspira muito nos processos de resistência da América Latina.

Ela critica as medidas de austeridade que, para ela, não solucionam a crise. “A austeridade não permite sair da crise, como se sabe muito aqui na região (América Latina). Ela só agrava a crise, a nossa ideia é o contrário e promover o crescimento da atividade econômica com investimento público massivo em serviços públicos”, afirmou.

Para ela, o recém-eleito presidente francês não será capaz de responder a crise, e diz que a frente está preparada para encarar a crise, e assumir o poder na França. “Temos um projeto muito radical, mas é uma radicalidade muito concreta. É isso que estamos tentando construir”.

Caros Amigos – Quando e porque nasce a Frente de Esquerda?

Raquel Garrido – O nascimento da Frente de Esquerda ocorreu em momento histórico na Europa onde parte da social democracia europeia se dá conta que seu papel histórico fracassou. Todos sabem que fracassou o comunismo de Estado que a partir da queda do muro de Berlim em 1989, que a social democracia teve essa oportunidade histórica de fazer o socialismo democrático, mas eles fracassam sobre um tema central que é a questão da integração europeia, porque a social democracia não conseguiu incluir nas regras fundamentais nos tratados europeus de natureza social e ecológica.

Esses tratados só têm regras de estabelecimento de um mercado, então são regras de livre circulação do capital, de proibição de subvenção aos serviços públicos em nome do livre mercado, e esse tipo de regra se tornaram de máxima importância na ordem jurídica na Europa, porque na hierarquia das leis esses tratados têm primazia.

Com os anos essas regras começaram a destruir direitos sociais do modelo social europeu e a social democracia nunca mudou sua estratégia frente a isso. Nós em 2008, inspirados pela nova onde de esquerda na América do Sul, decidimos sair do Partido Socialista (OS) e criar um partido com várias culturas políticas. Um partido funcional para a unidade do que chamamos de outra esquerda, porque na França já existia uma esquerda, a esquerda do PS, mas se encontrava totalmente fragmentada.

Então nós decidimos propor a toda essa esquerda uma união para criar um instrumento político com a estratégia assumida de passar à frente do PS como primeira força da esquerda para derrotar a direita na França, e assim se deu.

Convencemos o Partido Comunista (PC) de se juntar conosco na criação da Frente de Esquerda, em nossa primeira experiência eleitoral em junho de 2009 nas eleições para o Parlamento Europeu onde tivemos 6%, e elegemos 5 deputados europeus.

Isso foi uma surpresa para todos os especialistas que não acreditavam que era possível a unidade. Era a unidade que todos falavam que era impossível e desde então temos apresentado a Frente de Esquerda que atua de forma autônoma.

Até que conseguimos o mais difícil que foi a candidatura única para as eleições presidenciais. Isso foi uma tarefa difícil porque é só um candidato, é mais fácil fazer uma lista com outros partidos quando são vários candidatos para disputar as eleições congressuais, agora um candidato só é difícil, mas a dinâmica das eleições de 2009 convenceu a todos os militantes que a Frente de Esquerda era um instrumento necessário e agradável para militar.

Então o PC decidiu não lançar candidato e apoiou a Jean Luc-Melanchon e agora conseguimos 11% nas eleições, e 4 milhões de votos o que foi um resultado espetacular, mas nossa ideia não é ficar parado, tranquilos e gestionários desse resultado eleitoral. Estamos com uma estratégia de conquistar mais votos para ter a liderança da esquerda francesa.

CA – Quais as principais propostas para enfrentar a crise na França?

RG – A primeira coisa é derrotar as políticas de austeridade, porque a austeridade não permite sair da crise, como se sabe muito aqui na região (América Latina). Ela só agrava a crise, a nossa ideia é o contrário e promover o crescimento da atividade econômica com investimento público massivo em serviços públicos, e o que nós chamamos de planificação ecológica que é um processo de transformação da produção que se organiza conforme com critérios ecológicos, e segundo, técnicas que não destroem o meio ambiente e que precisamos desenvolver.

A Europa está diante de um grande desafio que é pagar a dívida ecológica e isso pode ser um motor da economia, porque isso implica muito trabalho de engenheiros para encontrar novas soluções ao problema central da humanidade hoje que é salvaguardar o seu próprio meio-ambiente.

Entendemos que a França tem todas as ferramentas para responder a essa necessidade, pois a França é um país com muitas riquezas, mas é um país muito desigual hoje, porque a direta organizou uma reforma tributária, uma redistribuição da riqueza ao contrário, dos pobres aos ricos e empobreceu sistematicamente o país.

Nos últimos 20 anos na França, 10% do PIB passaram do trabalho ao capital; é preciso recuperar esse recurso através da promoção de uma reforma tributária.

Outro ponto é aumentar o salário mínimo ao nível de 1.700 euros brutos mensais, hoje é de 1.200 brutos. Para efeito de comparação, o nível de pobreza na França é de 850 euros mensais. Hoje, quase 50% dos assalariados franceses ganha menos de 1.200 euros, então a situação está difícil, mas isso é política da direita, porque não é que a França é um país do fundo da África, temos muita riqueza. É necessário uma política para redistribuir a riqueza, essa é a primeira proposta da Frente de Esquerda para sair da crise, porque a direta tem tentado convencer que para pagar a dívida é preciso baixar salários, demitir e cortar serviços públicos.

Isso na realidade é um pretexto deles para aplicar políticas que mantém um espaço para o lucro, para o financeiro, porque além da redistribuição é urgente estrangular na França as possibilidades de ataques especulativos. Nesse sentido, o que nós propomos é que o sistema financeiro volte à sua função original que é garantir o financiamento estável dos recursos. Isso é a função original do sistema financeiro, não deveria ser de lucrar nos mercados especulativos e de fazer desses mercados especulativos um lugar de lucro em si. Então a ideia nossa é proibir tudo que não seja essa função de garantir o financiamento das atividades de intercâmbio. As duas coisas vão juntas, por um lado limitar a hiperacumulação de riqueza, porque a hiperacumulação é perigosa para todos porque cria especulação e essa especulação leva à crise.

Então é preciso garantir que ninguém ganhe mais do que 360 mil euros anuais, garantir que ninguém em uma empresa ganhe 20 vezes do que outro trabalhador da mesma empresa. Tudo isso é uma forma de lutar contra a crise financeira.

Outro elemento importante para sair da crise, e provavelmente o mais urgente, é obrigar o Banco Central Europeu (BCE) a emprestar diretamente aos estados, em particular à Grécia. Hoje o BCE empresta a um juros de 1% aos bancos privados e eles emprestam a 5%, 10%, 16%, 18% aos estados usando as agências de classificação como ferramenta para fazer subir esses juros. Isso é um escândalo total, porque o Banco Central empresta os bancos privados quantidades astronômicas de dinheiro e esses setores não reinvestem esses recursos na economia, eles não emprestam, guardam em forma de reserva ou emprestam aos estados a juros insuportáveis.

Então nós queremos obrigar os bancos a emprestar diretamente a um juro de 1%, ou funcionar como já foi feito na França que é o que foi chamado ‘empréstimo forçado’, ou seja, quem quer operar como banco tem que emprestar cobrando juros determinados pelo Estado, isso já funcionou durante o governo do Mitterrand. Essa é uma ferramenta que existe e que podemos utilizar.

A ideia nossa é apresentar propostas muito operacionais para enfrentar a crise, nosso plano é muito coerente, nós podemos tomar o poder amanhã de manhã que saberemos o que fazer. Então temos um projeto muito radical, mas é uma radicalidade muito concreta. É isso que estamos tentando construir.

O tempo e a realidade nos favorecem, porque François Hollande fica no marco programático da disciplina orçamental, então ele não irá conseguir dar conta da demanda social que foi a grande responsável pela derrota da direita. Ele não irá responder a isso seguindo uma política de disciplina orçamental. Então nós somos a alternativa a esquerda.

CA – Porque apoiar o Hollande no 2º turno das eleições?

RG – Para nosso projeto político de enfrentar a crise e tomar o poder o ponto número um era derrotar a Nicolas Sarkozy. Se a consequência do surgimento da Frente de Esquerda tivesse sido a manutenção da direita no poder o nosso projeto morreu. Então nós sempre fomos muito claros, nunca apoiamos o programa de Hollande, nunca sequer negociamos com ele, nada. Nós dizemos imediatamente que a Frente de Esquerda tinha que ser instrumental em derrotar Sarkozy, e assim foi. Os nossos votos foram fundamentais e decisivos para a derrota da direita porque sem nossos votos Hollande teria 40% no segundo turno, mas agora que derrotamos a Sarkozy começamos a política de verdade. Manteremos um perfil de autonomia, com uma presença na Assembleia Nacional, mas também na rua porque nossa campanha foi uma campanha de mobilização popular muito grande, e politizada.

Por exemplo, convocamos as pessoas a uma retomada da Bastinha no dia 18 de março e o tema era a fundação da 6ª República, a fundação de uma constituinte para a 6ª República, e essa ideia que parece um pouco conceitual quando falamos em uma mudança de repúblicas, mas 120 mil pessoas foram nessa atividade de retomada da Bastilha, e todos os atos de Melanchon foram massivos, em Marselha, Toulouse. Foi uma campanha muito mobilizada com a ideia de a luta que está à frente para romper com o pacto de austeridade e romper com os mercados financeiros precisam de um povo mobilizado.

Não queremos o poder para nós, queremos devolver o poder ao povo pela assembleia constituinte mais, além disso, nós falávamos que era preciso manter a mobilização porque é necessário para a realização de mudanças, como mostra a história, por exemplo na Argentina no enfrentamento com o FMI foi feito com o povo na rua. Não se pode fazer reuniões tranquilas entre governos.

CA – É possível pensar em saída da crise sem mobilização popular?

RG – A verdadeira luta hoje é entre a ultra direita autoritária e nós, porque a social democracia não vai conseguir apresentar uma saída para a crise. Fracassou terrivelmente na Grécia, na Espanha, em Portugal, na Irlanda, e boa notícia é inspirados nos processos que ocorreram na América do Sul estão surgindo novos instrumentos, como a Frente de Esquerda, como o Syriza na Grécia. Nos países onde não surgiu essa esquerda quem tem força, quem tem dinâmica é a extrema direita. Esse é o panorama na verdade.

CA – Qual avaliação da frente de esquerda faz dos governos da América Latina, como Chavés, Evo Morales, Cristina Kirchner?

RG – É uma inspiração muito grande porque foi daquela janela daqui que nós vimos que o projeto da social democracia europeia estava fracassando. Era difícil ver isso de pertinho. Os partidos sociais democratas europeus apoiaram os inimigos dos processos a esquerda na América Latina, como Dela Rua na Argentina, Fernando Henrique no Brasil.

Nos inspiramos em coisas muito concretas, como por exemplo, formas de organização como a frente amplo de coalizão. No final, acho que é o mais importante foi por um lado a luta contra o FMI na Argentina que é incrivelmente comparável com a situação atual da Europa e a resposta foram as assembleias constituintes, que é um invenção da revolução francesa.

Então foi impactante que esses processos se utilizaram desses métodos e deram um giro de prioridade política.

O Evo é um sindicalista, mas na minha opinião é que a força dos movimentos sociais na Bolívia veio justamente de entender que no marco institucional do antigo regime eles não iam conseguir uma transformação. Então eles adotaram como prioridade mudar as instituições, e então essa reivindicação cívica como primeira reivindicação deu uma força incrível e permitiu mobilizações de setores que entraram na vida cívica e política.

Esse novo aporte de sangue na luta política permitiu que a esquerda se enfrentasse de maneira séria com a direta, porque nós tem um problema que na França é muito forte que á a abstenção da classe operária, a direita está tranquila com isso porque ela já tem o poder econômico, não precisa mudar o sistema, mas nós que precisamos mudar o sistema não podemos fazer isso ficando em frente de casa olhando para a televisão.

Então essa é principal linha que vêm desses processos é entender que a Assembleia Constituinte é um método para criar à nova correlação de força que permitirá transformações. Estamos muito inspirados na América do Sul.

CA – Qual a importância das eleições na Grécia para o futuro da União Europeia?

RG – A Grécia está enfrentando um ataque especulativo, então a verdadeira questão é como enfrentar esse ataque especulativo, e se haverá solidariedade das instituições europeias para lutar contra o ataque. Para não ajudar a Grécia a direta alemã está dizendo que o verdadeiro tema de discussão é se acaso a Grécia tem ou não que ficar na Zona do Euro, mas não foi o euro que causou o problema de ataque especulativo é o ataque especulativo. Então se os gregos saem do euro o ataque especulativo se mantém, e pode até piorar, porque a moeda grega não tem como resistir a um ataque especulativo.

Então, os companheiros do Syriza falam assim eles não vão aceitar essa forma de fazer exigências que colocam pressão sobre os gregos. O discurso alemão é o de que só os defensores da austeridade é quem defendem o euro, mas não é assim. A esquerda mais próxima de nós acredita que o euro é importante, o euro é nosso, mas é preciso construir outro euro, um euro que não seja determinado por uma política monetarista, que sua função não deve ser só a luta contra inflação, que deve também ter outros critérios.

Então é possível que o euro acabe morrendo e é importante compreender que os Estados Unidos estão vivendo uma crise de hegemonia do dólar e não tem o menor interesse que o euro surja como moeda de troca internacional alternativa. Então eles, que falam que ajuda a Europa, têm interesses objetivos em que o euro esteja em crise para que não se torne uma moeda alternativa como moeda de troca internacional.

CA – O que esperar do governo de Hollande, em especial na relação com o governo alemão?

RG – Hollande tem como marco programático a disciplina orçamental , desse ponto de vista ele concorda com a direta alemã, mas ele fala que é necessário salvaguardar o crescimento. Então para é possível ter as duas coisas ao mesmo tempo, crescimento e a disciplina orçamental. Nós pensamos que isso é impossível, uma ilusão.

No melhor cenário nós pensamos que ele realmente tentar impor uma renegociação à Merkel (chanceler alemã) para conseguir um pouco de política a favor do crescimento, mas Angela Merkel já falou que ela não quer renegociar. As primeiras palavras dela no dia seguinte à eleição de Hollande foi que ela não queria renegociar, então acho que o método tranquilo, suave de Hollande para conseguir essa renegociação tem poucas chances de se concretizar.

Ele poderia fazer outra coisa, ele poderia fazer um referendo na França, se as pessoas votam pela renegociação, então tem que haver mecanicamente uma renegociação. Esse sim seria um método eficaz de conseguir uma renegociação com os alemães.
Isso até agora não é opção de Hollande, mas a existência da frente de esquerda autônoma, e exigente e preparada também é um elemento do contexto.

CA – O governo do Hollande pode entrar em crise como o Papandreau na Grécia?

RG – Um elemento importante na conjuntura francesa é que existe uma outra opção à esquerda, o que é uma coisa muito positiva, porque por exemplo na Espanha tinha uma população muito mobilizada como o movimento dos indignados, mas que do ponto de vista eleitoral não resultou na ascenção de uma força política contrária a austeridade, pelo contrário, houve um aumento da austeridade com a vitória do governo da direita (Mariano Rajoy), mas na França o que nós conseguimos foi dizer de forma muito clara que nós estamos preparadíssimos para fazer outra política no minuto em Hollande não souber mais o que fazer.

CA – Como se relacionar com os indignados?

RG – Na França o movimento não surgiu dessa forma porque a frente de esquerda conseguiu encontrar uma forma politizada de dizer a mesma coisa que é o seguinte: essas políticas de austeridade tem que ser aceitar por um povo, isso é uma questão democrática básica, e nós que passamos a reinvidicar uma assembleia constituinte para fundar 6ª república temos muita proximidade com o que surge através do movimento dos indignados conseguimos politiza-las e então conseguimos é que esse movimento de exigência cívica tomasse um conteúdo social e ecológico, e aquilo que foi impossível na Espanha, porque os movimento dos indignados não se apresenta como alternativa de governo. Na França a população está mobilizada em torno de uma pauta política operacional para governar.

Mas nossas relações com o movimento são boas nós ajudamos, avaliamos como algo positivo que os povos se mobilizem.

CA – Quais propostas a Frente de Esquerda apresenta para solucionar a crise a Zona do Euro?

RG – Primeiro coisa é que a crise atual não é crise do euro, essa explicação é aquela que artificialmente é usada pela direita alemã para proteger os bancos, e o setor financeiro. Então é importante dizer que temos as condições para enfrentar o mercado.

Sobre o euro, o importante é que ele equipare, em termos de valor, a economia real. O problema real do euro hoje é que ele está sobrevalorizado, pois ele está em um nível que corresponde a economia alemã, não corresponder a realidade econômica dos outros países do euro. Então todos os outros países estão financiando a Alemanha. Então é preciso desvalorizar o euro, e segundo ter uma política de condução do euro que seja mais democrática e assentada sobre objetivos de desenvolvimento e proteção de um interesse geral, social, ecológico, de criação de emprego.

É preciso também recuperar o Banco Central Europeu precisa ter uma política democrática, que hoje não existe.

CA – Você falou um pouco sobre a proposta de assembleia constituinte, gostaria que você explicasse um pouco melhor as propostas de fundação da 6ª república.

RG – A constituição na França é antidemocrática por uma razão principal que é a seguinte, o presidente francês é irresponsável politicamente ante ao parlamento, e mais ainda ante ao povo. Por exemplo, quando Sarkozy foi eleito em 2007 no seu programa ele prometeu não aumentar a idade de aposentadoria, então esse foi seu programa para qual foi eleito para um mandato, mas em 2010 ele aumenta a idade da aposentadoria de 60 para 62 anos. Isso foi uma traição de seu mandato original, o que causou ebulição política e mobilizações por todo o país, onde 3 milhões de pessoas entraram em greve. Por essa razão que ele não é responsável ante o parlamento ele não alterou nada no seu projeto, nem um milímetro, nada, e aguardou o fim das mobilizações. Depois de 1, 2,3 meses quando não se vê nenhuma possibilidade de negociação, o movimento morreu.

É a constituição da quinta república que permite isso, porque normalmente nessa situação os deputados, inclusive da direita, diziam assim que a base estava mobilizada que precisava haver discussões com o movimento, mas o presidente não cedeu então essa situação é insuportável em uma democracia. Então é muito importante conseguir seguir militando rumo a 6ª república parlamentar e para essa ideia de que a representação política hoje está muito longe de ser democrática. É preciso que afirmara necessidade da soberania popular.

CA – Qual a importância de partidos amplos como a Frente de Esquerda na França?

RG – É muito importante isso, é muito importante que o que chamamos de outra esquerda devem entender que a social democracia europeia está morrendo. Se nós não criarmos essa alternativa de esquerda, isso significa o desaparecimento de toda a esquerda como aconteceu na Itália onde o processo de ida da social democracia ao centro, sem que surgisse uma alternativa de esquerda resultou em um desparecimento total da esquerda na Itália, onde não existe um deputado na câmara que se caracteriza como comunista.

Então é preciso que haja o surgimento de partidos de esquerda que estejam dispostos a governar, que seja radical em suas medidas, porque o tempo é radical, porque a luta que teremos e estamos enfrentando obriga que a luta seja radical, mas não é radical porque as coisas devem ser ideologicamente radicais, não é assim.

Estamos debaixo de um grande ataque especulativo, e precisamos nos defender diante desse contexto, mas o que é importante é determinar o programa que tenha radicalidade concreta em lugar de discussões ideológicas sem fim, o que é um mau hábito da esquerda, que sempre começa pelas dificuldades.

A técnica nossa foi começar pelas coisas mais fáceis, por exemplo, na redação do programa comum a técnica foi assim pegamos tudo o que nós concordamos, se não concordamos deixamos para mais tarde. Não começamos a discussão por onde não temos acordo.

 

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Wallerstein: por que o futuro da Europa é importante

26/05/2012

Num cenário conturbado, Grécia e França empurram continente à esquerda, pressionando Alemanha. Se esta ceder, toda conjuntura global mudará

Por Immanuel Wallerstein | Tradução: Daniela Frabasile

As eleições nos sistemas parlamentares ocidentais sempre têm a ver com o centro. A situação mais comum é aquela em que existem dois partidos dominantes – um mais à direita e outro mais à esquerda do centro. Existem diferenças entre as políticas que esses partidos colocam em prática quando estão no poder, mas também enormes semelhanças. A eleição nunca expressa uma divisão política profunda. Seu papel é, em vez disso, o de de redefinir e relocalizar o centro – o ponto de alavanca, na gangorra entre os partidos.

Uma situação muito mais rara é o repúdio ao centro e, portanto, aos dois partidos – anteriormente principais – que se posicionam próximos ao ponto central. Esse resultado joga as políticas nacionais em um grande turbilhão, o que por vezes tem impactos consideráveis fora do país.

As últimas eleições na França e na Grécia ilustram bem essas duas situações. Na França, os socialistas derrotaram o partido conservador UMP, e deslocaram o centro. Num cenário caótico do sistema-mundo, e particularmente na União Europeia, o deslocamento o centro na França terá grande impacto. Mas não espere que as políticas reais de François Hollande sejam radicalmente diferentes daquelas de Nicolas Sarkozy.

Na Grécia, aconteceu o contrário. O centro foi dramaticamente repudiado. Os dois maiores partidos – o conservador Nova Democracia e o socialista Pasok – perderam mais de metade dos votos que normalmente obtinham. Somados, caíram de aproximadamente 2/3 para 1/3 do eleitorado. O Pasok despencou para o terceiro lugar, ultrapassado por uma coalizão de partidos mais à esquerda, a Syriza, considerada a grande vencedora da eleição. O tema central das eleições foi o programa de austeridade imposto à Grécia pelas forças estrangeiras, e mais fortemente pela Alemanha. Todos os partidos, exceto os dois tradicionalmente maiores, anunciavam repúdio às medidas de austeridade. O líder da Syriza, Alexis Tsirpas, afirmou que os resultados da eleição anulam o comprometimento do governo anterior com o programa de austeridade.

O que acontecerá nos próximos meses? Na Grécia, como os três partidos com mais votos – Nova Democracia, Syriza e Pasok – não conseguiram formar um governo, haverá novas eleições [em 17/6]. A Syriza pode até ser o primeiro colocado, no próximo pleito. Como o governo grego não receberá mais apoio internacional, não conseguirá pagar os empréstimos. O ministro de relações exteriores da Alemanha já ameaçou uma expulsão da zona do euro. Porém, não existe forma legal de fazer isso. E como a população grega parece pensar que sair da zona do euro não resolveria nada e provavelmente pioraria a situação, haverá um impasse. Os gregos irão sofrer muito. Mas muitos bancos europeus também. Assim como a população alemã, mesmo que esta ainda não esteja consciente disso.

Enquanto isso, haverá novas eleições na França, agora para o Legislativo [em 10 e 17/6]. Analistas preveem uma ampla vitória socialista, porém com significativo contingente de votos para o equivalente francês da Syriza, a Frente de Esquerda. A clara posição de Hollande é que o crescimento europeu deve ter prioridade em relação à austeridade – um desafio direto à posição alemã. Por isso, o centro será ainda mais deslocado para a esquerda.

Os alemães estão agora sob enorme pressão. Existe um descontentamento interno, que leva a perdas eleitorais do partido da chanceler Angela Merkel, o CDU, e sua coalizão neoliberal parceira, a FDP. Os outros partidos social-democratas na Europa foram encorajados pela vitória de Hollande a se moverem de algum modo para a esquerda. Os dois partidos conservadores na coalizão do governo da Itália sofreram perdas graves nas eleições municipais de maio. Também existe pressão dos Estados Unidos sobre a Alemanha, para se mover na direção que Hollande apoia – o que é estranho, porém importante.

Os alemães podem resistir a tudo isso – até 31 de maio, a data do plebiscito irlandês. O governo irlandês é o único membro da zona do euro que depende de um plebiscito para aprovar o novo tratado de austeridade em que Merkel tanto insistiu, com apoio de Sarkozy. As pesquisas sugerem uma disputa acirrada. O governo irlandês está confiante de que poderia ganhar votos em favor do “sim”, mas a vitória de Hollande pode influenciar os eleitores para que o “não” prevaleça, o que anularia o tratado de austeridade. Isso iria enfraquecer a posição alemã ainda mais que o repúdio grego ao centro.

O que acontecerá, então? A chave é o cenário alemão. Angela Merkel, como qualquer líder político, tenta ver para que lado os ventos sopram. Por isso, sua linguagem já começa a evoluir. Pode ser até que, secretamente, ela comemore as pressões externas para fazer o que, do ponto de vista da Alemanha, é a coisa sensata: fortalecer o poder de compra (para produtos alemães, entre outras coisas) no resto da União Europeia.

Se a Alemanha se mover nessa direção, o euro e a União Europeia irão sobreviver, e continuar a ser um grande ator (ainda que chamuscado…) na cena geopolítica. No plano mundial, o deslocamento do centro na Europa como um todo não irá congelar o status quo, mas acelerar os realinhamentos geopolíticos que são inevitáveis. Além disso, o deslocamento do centro na Alemanha pode ajudar a Europa a resistir melhor ao tsunami – de colapso de fundos soberanos e do dólar como moeda de reserva – que se aproxima.

O mundo inteiro está nadando em águas muito agitadas. A Alemanha pode logo se juntar à lista de estados que começam a entender como navegar em meio ao caos. Governos inflexíveis são seus próprios piores inimigos.

Wallerstein: por que o futuro da Europa é importante

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